(Este texto foi
publicado nas Notas do meu Facebook no mês de maio. Agora publico aqui porque
se trata de um pedaço importante da minha vida)
Não sou pessoa de ter ídolos. Nunca
fui, nem sequer na adolescência quando atrizes/atores, cantores e gente do
mundo do espetáculo ocupam um lugar importante na nossa vida. Nem sequer, tão
pouco, do ponto de vista familiar (fica sempre bem dizer que a mãe ou o pai é o
nosso ídolo) ou profissional. No âmbito familiar a minha avó paterna ocupa um
lugar de grande destaque e, agora que escrevo isto, talvez seja o único ídolo
que se perpetua na minha vida. Na minha profissão, uma das áreas que mais
valorizo, tendo imensas fontes de inspiração, quer por serem figuras centrais,
reconhecidas em todo o mundo (desde a mitológica Florencce Nightingale ou aos
inspiradores Carl Rogers e Jean Piaget aos modernos autores de enfermagem e de
psicologia, passando por todos os intermédios como a minha teórica preferida,
Jean Watson), quer por se configurarem como modelos do que é ser enfermeiro, e
professor de enfermagem (e aqui sou rica, tendo recebido influência de muitas
pessoais das quais não posso deixar de nomear aquelas em que um dia eu soube
que queria ser também assim: Ana Paula Amaral; Sacha – Maria Saavedra de Bruges;
Jesuína Varela; José Amendoeira; Isabel Estrela Rego; Ermelindo Peixoto),
também não existe um ídolo. Não no conceito habitual de ídolo.
Dou um pequeno passo atrás e ao
lado para retomar o que se configuram habitualmente como ídolos – pessoas
distantes que admiramos como fazemos com o sol, mas que precisamente como o
astro, estão demasiado longe e se nos aproximássemos queimar-nos-íamos – e
reafirmo que nunca os tive. Sempre gostei de música. Do que oiço contar, desde
bebé. É algo familiar, havendo histórias de, ainda em criança, haver quem se
ajoelhasse perto do rádio para ouvir alguma canção enquanto chorava. Não fui
eu! Efetivamente fui uma criança durona. Como testemunha a minha família que um
dia já foi grande, em criança sentava-se avó, pais, tios, primos, em meu redor,
e eu cantava. Não me recordo bem o quê mas sei que a Amália Rodrigues e a Maria
de Lourdes Rezende estavam no repertório. Recordo que o “Fado do Cacilheiro”
era obrigatório. E a música clássica fez sempre parte da família.
Na puberdade entram de repente
(como quase tudo na puberdade) várias canções e cantores: Simone de Oliveira
com “A Desfolhada” e, para mim, o ainda melhor, “Sol de Inverno”; Green
Windows; Gemini; Cocktail; Doce; Paulo de Carvalho. Penso que estes eram os
principais. Do estrangeiro, imensos. Num país em que, essencialmente, só se
ouvia música anglófona, ter fixado os portugueses acima já foi alguma coisa… E
também chegou Edith Piaf, Joe Dassin, Charles Aznavour e Art Sullivan. De
língua inglesa vieram todos os outros, impossíveis de enumerar aqui. Dos quais,
estranhamente, não constam os Beatles (ainda que posteriormente tenha gostado
muito de Paul MacCartney – a este devo o meu primeiro casamento, salvo seja, e
é outra história – e de John Lennon) E de Espanha apenas um: Camilo Sesto.
Era na sala da minha casa, mais
tarde também na garagem, que eu com algumas amigas muito selecionadas (para ter
permissão de entrar na minha casa era mais difícil do que no Palácio de Belém
ou na própria Base Aérea nº 4 e que não nomeio porque não sei se gostarão mas
se lerem isto, saberão que me refiro a elas) nos juntávamos para ouvir as
canções e falarmos daquelas coisas que as meninas com as hormonas aos saltos
falam. Uma dessas amigas, já eu era mais entrada nos “teen” vinha a minha casa
e dizia-me “Paula, canta-me os ABBA”. Nunca me pediram para cantar em francês
ou em espanhol. Talvez por isso eu nunca tenha aprendido esses idiomas. Quero
dizer, o espanhol estou agora a aprender por motivos muito fortes. Mas a par de
ótimos professores, em conjugação com um ouvido treinado na televisão
americana, o de berço “Channel 8” da Base das Lajes, os ABBA foram uma forma
muito boa de aprender inglês.
Destas vivências formulo o meu TOP
TOP TOP, que atualmente eu refiro como TOP 5 e que significa que eu gostava de
todas as suas canções conhecidas. Com sinceridade, não são todas. Mesmo dos que
ocupam os dois primeiros lugares (e são 2 em ex aequo), há duas canções, uma de
cada, de que não gosto. Mesmo nada. E dos que ocupam as posições seguintes há
algumas que não me agradam. Mas são o meu TOP porque gosto de quase todas,
mesmo quase todas.
Meu TOP 5
1 – ABBA/Camilo Sesto
2 – Bee Gees
3 – Lionel Richie
4 – Cliff Richard
5 - Donna Summer
Assim, este TOP é constituído por
cantores de língua inglesa. Apenas Camilo Sesto não o é ainda que cante (muito
e bem em inglês, além de o fazer também em português – do Brasil -, italiano,
francês e alemão).
Mas nenhum foi meu ídolo. Dos ABBA
a minha preferência foi sempre Agnetha Fältskog pela linda voz e ar angelical.
O grupo terminou quando ainda eram muito escassas as publicações em Portugal sobre
o mundo das canções. Penso que terei sabido que os ABBA já não existiam talvez
meses depois disso suceder e foi um desgosto muito, muito grande. É já no mundo
da internet que descubro muitos anos depois (e há muitos atrás) de que uma das
razões de rutura foi precisamente Agnetha. Hoje tenho todos os livros que pude
encontrar dela e do grupo e entendo perfeitamente as suas razões. Serão sempre
os meus ABBA e ela a angelical “golden hair girl”.
Camilo Sesto. Camilo é outra
história.
Chega à minha vida como,
possivelmente à de todos os portugueses com “Quieres ser mi amante?” Para uma
miúda de 12 anos é um título forte. Na minha cabeça “amante” queria dizer
simplesmente namorada. À boa moda dos Açores não me passava pela cabeça que ele
se referisse ao estado de “ser ameigado”. Na minha casa isso era inconcebível.
No meio das frases que eu apenas intuía pela proximidade entre o meu idioma e o
do artista, quando eu acabava de viver um amor de Verão que estava a mais de
1000 Km de distância, “ni estando lejos te olvido”, era a minha frase. Estávamos
em 1976 (a canção é bastante anterior mas talvez as coisas chegassem a nado aos
Açores…) e eu tinha acabado de fazer 12 anos.
Posteriormente chega a Portugal as
outras duas canções que eu penso que, depois desta, tenham sido mais conhecidas
por cá, “Melina” e “Algo Mais”. Infelizmente para nós Camilo Sesto nunca esteve
em Portugal. Durante a sua fulgurante carreira fazia-se acompanhar pela sua
banda, Alcatraz, que com mais de 40 músicos, pode ter complicado contratos e
acordos de custos com o nosso país (afinal eram todos profissionais a quem
havia que pagar salários). Enquanto o seu nome ficou bem estabelecido noutros
países europeus além de Espanha, nas Américas e no Japão, nós não tivemos o
privilégio de o ter nunca em palco. No Brasil, sim, esteve, nomeadamente no
Festival da OTI em 1973.
Segui a sua carreira até 1983 ou
1984 quando a minha entrada na Escola de Enfermagem e depois no mundo
profissional (entre outras razões) me afastam muito destas preferências, o que
basicamente coincide com a retirada do artista após o nascimento do seu filho
numa opção de se tornar pai a tempo integral.
Mas Camilo Sesto não foi também meu
ídolo.
Houve uma tentativa de ter um
poster dele nas paredes do meu quarto como tinha de outros artistas. Mas foi-me
mais ou menos comunicado de modo mais ou menos formal que não era permitido
“aquele” poster ali. Se eu o publicasse aqui compreender-se-ia porquê. Numa
família tradicional em que todos eram anjos (não por bondade mas por não ter
sexo), um poster assim nas paredes era meio caminho andado para a perdição. Eu
teria de redescobrir Camilo Sesto depois dos 40 anos para descobrir qual era o
problema do póster. Ó santa inocência!!!!
O seu nome “Sesto” sempre me soou
algo estranho. Não necessariamente desagradável. Eu gostava demasiado de tudo o
que cantava (menos uma canção!) para que o nome me desagradasse. Mas era
estranho. Porém, num mundo onde existiam grupos chamados “Doce”, “Cocktail” e
por aí fora, “Sesto” era só uma forma aproximada de um numeral.
Reitero. Camilo Sesto não foi nunca
um ídolo para mim.
Eu era sua fã, iniciei um clube de
fãs, tanto quanto sei, o único português, na “Crónica Feminina”. Era outra
mania minha. Quando não havia redes sociais eu tinha um clube de fãs de um
cantor espanhol e um clube de correspondência. Tudo publicado na Crónica
Feminina. Pergunto-me se ainda existirão amizades feitas nesse clube ou até
casamentos. Cheguei a ter de escrever mais de 100 cartas por semana para todo o
mundo. Houvesse dinheiro para o correio. Mas esta também é outra história.
Quando me dou oportunidade de a
música voltar á minha vida, redescubro Camilo Sesto (estranhamente - ou não -
os Bee Gees e os ABBA nunca se afastaram). Sei do seu projeto “O Fantasma da
Ópera”, sigo o lançamento dos seus últimos CDs, nomeadamente “Alma”, “Número 1”
e “Todo de Mí”, sonho em ir a Viña del Mar em 2004, quando arrasou literalmente
o júri e os espetadores arrecadando todos os prémios possíveis mas, é quando
anuncia a sua retirada e a sua última presença em palco em Espanha em 2010, que
levo o susto de compreender que nunca o veria pessoalmente nem assistiria a um
concerto seu. Foi um desgosto. Grande. Como quando os ABBA se retiraram. Mas
num mundo mais pequeno e global como o atual não fazia sentido. Todavia, não
pode mesmo ser.
Entretanto, o clube de fãs tinha
sido recuperado, graças ao Facebook (pode ter muita coisa má mas tem também do
melhor deste mundo). Sinceramente não sei se sucedeu em Maio. Porém, por
algumas, outras e boas razões, associo este mês a Camilo. E pelos vistos não
sou só eu pois o dia 28 de Maio é o Dia de Camilo Sesto no Estado do Nevada,
EUA. E talvez, como Camilista, ainda se seja muito feliz em meses de Maio…
É em Maio que eu tenho o meu
primeiro ídolo. Mas não é Camilo Sesto.
Camilo Sesto é o nome artístico de
Camilo Blanes Cortés.
Qualquer simples busca no Google ou
outro motor de busca que eu não recebo nada pela publicidade, mostra quem é (já
agora no grupo Camilo Sesto - Fãs de Língua Portuguesa também): cantor,
compositor, letrista, poeta, ator, tradutor, pintor, produtor – e muitos “ores”
mais. A sua interpretação do papel de Jesus em Jesus Cristo SuperStar é
lendária e alvo de estudos especializados. O estrondoso número de êxitos e de
canções que figuram em primeiro lugar dos TOP em diferentes países também se
encontra facilmente. Tudo o que houver de mais honroso e público sobre Camilo
Sesto está aí em todas as fontes possíveis e imaginárias. É só procurar. Desse
sou fã.
O meu ídolo é Camilo Blanes (para
evitar enganos de interpretação, explico: o pai. Em Espanha e nos países
hispânicos, o nome paterno é o primeiro a seguir ao nome próprio – o inverso de
Portugal, dos países lusófonos e dos demais países ocidentais – e clarifico, o
pai, porque o seu filho é seu homónimo, ainda que no caso deste, seja
igualmente o nome artístico). Perguntar-se-á “Mas Camilo Sesto e Camilo Blanes
não são a mesma pessoa?” e eu respondo: sim e não. Não vou explicar. Só afirmo
que o meu ídolo é Camilo Blanes [Cortés].
É em Maio de 2014 que tenho a
oportunidade de o conhecer em carne e osso. De vê-lo à minha frente em palco, ainda
que esse palco seja o plateau de uma televisão. É público e o que é público eu
posso dizer (o que não é, morrerá comigo – afinal já há gente demais que por um
espirro afirma essencialmente que dormiu ou dorme debaixo da cama de Camilo).
Vê-lo entrar foi algo surreal. Camilo mede 1.86m mas a perceção que eu tive foi
de ver entrar um gigante (que o é artística e metaforicamente). Literalmente. Mal
sabia eu que confirmaria que o é também do ponto de vista humano – El Blanes.
E foi pela sua dimensão humana, “El
Blanes”, que se tornou meu ídolo. Como o são as pessoas que fazem o favor de
ser minhas amigas e de permitirem que eu seja delas. Tudo começou no mês de
Maio; a ida à televisão (estranhamente não me recordo nem tenho registado o dia
do programa – se alguém souber, diga-mo por favor que eu agradeço – os
acontecimentos exultantes não têm historia e, depois, atrapalhamo-nos e
esquecemos datas) e uma das notícias com mais impacto na minha vida (esta a
12). Posteriormente, com a situação de saúde que me assolou e em que a morte
espreitou diversas vezes, mais ainda esta posição se firmou para mim. Foi Deus
onde está, o meu cirurgião em Ponta Delgada em conjunto com a equipa de
enfermagem do serviço de Cirurgia III do HDES que me salvaram a vida. E, sem
dúvida, a minha família (agora pequenina, o meu marido, o meu filho mais novo,
a minha mãe e os meus primos, Liliana e Jorge), Camilo Blanes – que passou a
ser oficialmente o Meu Anjo Azul - e os meus amigos de coração, portugueses e
estrangeiros. Estes foram quem me salvaram e deram vida (é uma redundância mas
hoje quero-a).
Deste modo, o mês de Maio é para
mim o mês do meu ídolo. Além de continuar a ser, como tem sido, desde que está
na minha vida, o do meu marido, por ser o mês do seu aniversário. Sorrio
enquanto imagino a pergunta de quem me lê e que com alguma frequência me fazem
“E ele [ou o Jorge; ou o teu marido; ou o seu marido] não tem ciúmes?” E pela
primeira vez eu respondo em público o que tenho respondido a quem me faz a
sacramental pergunta: “Não. O meu marido é muito inteligente. Se tivesse ciúmes
ficava com dois problemas.” E efetivamente o meu marido é demasiado inteligente
(cognitiva e emocionalmente) para ter ciúmes do meu ídolo. Não foi por acaso que
só do 3º marido eu aceitei o apelido. O Jorge é “El Amor de Mi Vida”, a pessoa
que me dá a estabilidade de que eu necessito. Ou seja, a maior riqueza que eu
posso ter, porque a minha veia de inquietação e de loucura (de “fresa salvaje”)
necessita assim deste porto seguro (não é coincidência que tenha sido a
primeira cidade que conhecemos no Brasil). Mais do que de qualquer outro tipo
de riqueza. Com isto e saúde eu sou feliz. No mês de Maio. E em todo o ano.